O bom ambiente de trabalho é fundamental para o sucesso de qualquer empresa e de seus profissionais. Entretanto, as relações trabalhistas podem gerar diversos problemas que colocam os empregados, de diferentes níveis hierárquicos, em situações de conflito. Dois dos mais graves são discriminação e assédio moral. E, dependendo do grau, pode ser considerado crime.
O advogado Guilherme Ribeiro, especialista em Direito e Processo do Trabalho e sócio do escritório Baraldi Mélega Advogados, explica que a discriminação reflete diretamente nas oportunidades ou no tratamento no ambiente de trabalho. “Importante ressaltar que assédio e discriminação são coisas diferentes. O assédio é caracterizado por qualquer conduta abusiva que, intencionalmente, e com frequência, atinja a integridade física ou psíquica de uma pessoa no ambiente de trabalho. A discriminação é relacionada a distinção, exclusão ou preferência, com base, por exemplo, em raça, cor, sexo, religião, nacionalidade ou origem social, que reflita nas oportunidades no trabalho.”
As discriminações mais comuns praticadas por empregadores são, segundo a advogada Juliana de Oliveira Afonso, do escritório Yamazaki, Calazans e Vieira Dias Advogados, as racistas e as de gênero, especialmente no que tange à diferença salarial entre homens e mulheres. “Também são bastante comuns as praticadas contra portadores de deficiência ou patologias, sejam congênitas ou adquiridas ao longo da vida, como, por exemplo, o HIV e o câncer.”
Juliana também ressalta que, atualmente, com o aumento da imigração ilegal, tornaram-se mais comuns a discriminação e a imposição de trabalhos escravos ou análogos à escravidão aos estrangeiros vindos, especialmente, de países economicamente menos desenvolvidos. “Esta prática discriminatória ainda é muito comum também com relação aos trabalhadores migrados de regiões mais pobres do País”, observa.
A especialista destaca, ainda, que é corriqueira a discriminação de funcionários das mais diversas orientações sexuais, “especialmente os que optam pela troca de gênero, os quais têm grande dificuldade de colocação no mercado de trabalho por preconceito”.
Letícia Loures, advogada trabalhista do Aith, Badari e Luchin Advogados, esclarece que a Constituição Federal estabelece que todos são iguais perante a lei, garantindo a todos o direito a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade e à segurança. “Assim, a discriminação é caracterizada quanto a inviolabilidade dos direitos é desrespeitada, afrontando os princípios constitucionais”, afirma.
O QUE FAZER? – O funcionário que sofre discriminação no ambiente de trabalho deve comunicar o fato ao seu superior hierárquico, para que o mesmo possa punir, por meio de advertência, suspensão e, até mesmo, se houver reincidentes discriminações, demissão por justa causa, a pessoa que comete o ato de discriminação.
“Caso a discriminação seja efetuada pelo superior hierárquico, o trabalhador deverá comunicar o fato ao departamento pessoal da empresa para que o mesmo possa tomar as medidas cabíveis. Se todos ficarem inertes à situação, o funcionário deverá, então, se dirigir ao Ministério do Trabalho e Emprego ou às delegacias regionais do trabalho para efetivar e registrar a denúncia”, orienta Letícia.
Juliana reforça que o funcionário que sofreu discriminação pode também procurar delegacia de polícia e registrar o ocorrido, para que se possa averiguar se a prática discriminatória consiste ou não em crime. “Existem práticas consideradas crimes, como a de racismo, que se trata de delito inafiançável e imprescritível. Além disso, a pessoa também deve recorrer à Justiça do Trabalho, pessoalmente ou por meio de advogado, para que seja indenizada, material e/ou moralmente e, eventualmente, caso haja dispensa, reintegrada ao emprego.”
Os especialistas ressaltam que as leis protegem os trabalhadores e proíbem, por exemplo, diferença de salários para a mesma função em razão de sexo, raça, nacionalidade, estado civil, idade ou deficiência. A lei 9.029, de 1995, veda “qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros”.
Já com relação às mulheres, a mesma legislação considera crime a exigência de testes relativos à esterilização ou estado de gravidez, assim como o induzimento à esterilização genética.
Empresa que não fomenta combate é punida
O especialista Guilherme Ribeiro, do escritório Baraldi e Mélega Advogados, explica que muitas companhias, principalmente as de maior porte, instituem políticas de relacionamento entre funcionários, inclusive com linhas de atendimento que preservam a identidade do trabalhador que utiliza dessa ferramenta para denunciar situações diversas, entre elas de assédio e discriminação.
“Ao receber a informação de ocorrência de assédio e discriminação entre seus colaboradores, a empresa deve agir rápido para analisar se realmente a situação caracteriza tais condutas e, uma vez identificadas, punir o assediador, inclusive com a demissão, se necessário. Ao permitir situações de assédio e discriminação no ambiente de trabalho, a firma corre risco de sofrer consequências administrativas e judiciais tanto por parte do trabalhador quanto do poder público”, afirma o advogado.
O especialista destaca que a discriminação pode ser passível de punição na Justiça do Trabalho, caso seja considerada discriminatória. “A empresa deve tomar muito cuidado, pois, no Brasil, a dispensa é permitida sem a indicação do motivo, desde que o empregador arque com todas as verbas legais decorrentes da demissão. Contudo, a demissão pode sofrer algumas restrições, como em casos de empregados detentores de estabilidades ou garantias de emprego.”
No caso de ocorrência de discriminação no desligamento, a lei 9.029/1995 prevê que o rompimento da relação de trabalho por atos discriminatórios relacionados a sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional e idade, além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre a readmissão com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, ou a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento”, relata Ribeiro.
O TST (Tribunal Superior do Trabalho), corte superior da Justiça trabalhista, editou súmula que resguarda o direito de reintegração ao trabalho de empregados portadores de doença grave que suscite estigma ou preconceito, que tenham sido demitidos em razão da doença.
Em regra, no momento da demissão, a discriminação se caracteriza por ser o fato motivador do desligamento do funcionário, revela a advogada Juliana Afonso, do escritório Yamazaki, Calazans e Vieira Dias Advogados. “A título exemplificativo, podemos citar a funcionária que, logo após descobrir que está grávida, é demitida, a fim de evitar que a empresa fique com o quadro desfalcado durante o período de afastamento. Outro caso comum é a dispensa do funcionário portador do vírus HIV que, ao informar ao empregador sobre sua condição, é dispensado para evitar que a empresa tenha um funcionário que pode se ausentar do trabalho com mais frequência em razão de tratamentos médicos.”
REINTEGRAÇÃO – Os especialistas garantem que o funcionário dispensado de maneira discriminatória pode pedir a sua reintegração ao emprego, sendo que há a possibilidade de optar pela manutenção da demissão e recebimento, em dobro, da remuneração do período de afastamento. “O funcionário pode requisitar a nulidade da dispensa, a reintegração e uma indenização por danos morais”, destaca Letícia Loures, advogada trabalhista do Aith, Badari e Luchin Advogados.
Na visão de Juliana, “uma vez comprovada a existência de assédio ou discriminação dentro do ambiente de trabalho, a aplicação de severas punições às empresas que praticam tais ilícitos é a medida aplicada pela Justiça para coibir a reincidência. Importante ressaltar que é o entendimento atual da Justiça do Trabalho de que a dispensa, por si só, de pessoas com doença grave, que suscite estigma ou preconceito, tal como o HIV, é considerada presumidamente discriminatória”.
FONTE: Diário Grande ABC