O Serviço de Fiscalização e Produtos Controlados do Exército Brasileiro desencadeou nesta segunda-feira no Rio Grande do Sul uma grande operação – denominada Dínamo III – de fiscalização de explosivos e produtos correlatos. Um grupo de 95 militares gaúchos, especializados no assunto, realiza ao longo do dia vistorias de surpresa, em empresas cadastradas ou não no Exército, que exercem atividades com esse tipo de material. A ação conta com apoio das polícias Federal, Rodoviária Estadual, Civil, Militar, do Departamento Nacional de Produção Mineral e do Ministério Público Federal.
O principal objetivo da operação é evitar ou reduzir a possibilidade de uso ilícito de explosivos utilizados por empresas registradas. Zero Hora mostrou, em reportagem publicada há uma semana, que dinamite e TNT são desviados e empregados em assaltos. Investigação da Polícia Civil provou que pelo menos 10 dos 32 ataques com explosivos a agências bancárias no espaço de um ano no Rio Grande do Sul utilizaram dinamite (emulsão explosiva) desviada de pedreiras ou de empresas que revendem esse tipo de material perigoso. Em sete desses assaltos, o explosivo foi adquirido de uma mesma empresa de Santa Catarina.
A Polícia Civil conseguiu rastrear a origem dos explosivos porque cada banana de emulsão (dinamite) precisa de um cordel que a liga à espoleta que vai detonar o explosivo. E essa espécie de corda possui uma inscrição com 25 números, que indicam a data de fabricação, o local e a metragem do artefato. Isso é obrigatório por lei. Os policiais conseguiram verificar quem revendeu o material.
A operação “Dínamo III” apreendeu, no primeiro dia, 3.890 kg de explosivos e 1.184 metros de cordel, apenas no Rio Grande do Sul. Mas ela acontece em todo o país. A coordenação é da Diretoria de Fiscalização e Produtos Controlados (DFPC) do Exército, sediada em Brasília-DF. Todo a venda e uso de explosivo no país deve ser controlada pelas 300 unidades Exército espalhadas pelo Brasil. Cada Estado possui pelo menos uma seção para esse tipo de controle.
As equipes verificam as atividades de produção, armazenamento, comercialização, transporte e utilização desses materiais. A classificação de um produto como “controlado pelo Exército” tem por premissa básica a existência de poder de destruição ou outra propriedade de risco. É também necessário que o uso seja restrito a pessoas físicas e jurídicas legalmente habilitadas, capacitadas técnica, moral e psicologicamente, de modo a garantir a segurança da sociedade e do País. A atuação do Exército Brasileiro é regulada pelo Poder de Polícia Administrativa, amparado no Decreto nº 3.665, de 20 de novembro de 2000 (R-105) e no Estatuto do Desarmamento.
Investigação policial
A Polícia Civil investiga se os ladrões de caixas eletrônicos fazem lavagem de explosivos. É o termo usado para venda ilegal de dinamite e seria executada por empresas aparentemente idôneas e devidamente cadastradas pelo Exército — órgão que controla esse tipo de material no Brasil. Um exemplo: uma pedreira pode informar que serão usados oito quilos de dinamite para detonar rochas, mas, na verdade, usa cinco. Os três quilos restantes são vendidos para o crime organizado.
Por quanto? Os policiais ressaltam que empresas autorizadas podem adquirir emulsão (explosivo) por até R$ 0,80 o quilo. Já as quadrilhas costumam pagar, no mercado paralelo, até R$ 1,5 mil pelo kit (o explosivo, mais o cordel e o pavio), o que mostra a rentabilidade do desvio da dinamite.
Pelo menos 60 empresas trabalham com explosivos no Rio Grande do Sul. Dos oito casos em que a Polícia Civil conseguiu rastrear a origem do explosivo usado no ataque a agências bancárias em 2014 e 2015, seis ocorreram a partir do encontro de cargas pertencentes a uma empresa catarinense, a Planalto Serviços e Explosivos Ltda. (Planex), empresa de Capão Alto.
Empresa garante ter permissão para revender material
Os explosivos foram abandonados pelos ladrões ao deixarem os bancos às pressas. A Planex compra dinamites que são usadas em pedreiras catarinenses e gaúchas, via de regra. A Delegacia de Roubos e Extorsões da Polícia Civil gaúcha realizou uma busca na sede da empresa, próxima a Lages, neste ano. Fica perto da BR-116. No local, foram encontradas sobras de lotes de explosivos. Os empresários, ouvidos, garantem que têm permissão para revender o material a terceiros. A Polícia Civil investiga se a dinamite foi revendida a bandidos.
— Vendemos explosivo com autorização do Exército, para empresas, pedreiras. Não temos culpa se o explosivo é roubado ou desviado dessas firmas e vai parar na mão de cabeças ocas — diz Rosendo Madureira, um dos donos da Planex.
O Exército também revistou a Planex e considerou que tudo estava licenciado adequadamente. Um ex-proprietário dessa empresa, porém, já teve a autorização para explosões cassada por irregularidades. Passou sua parte da sociedade para um familiar.
As seções de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército realizaram, no Rio Grande do Sul, 750 fiscalizações neste ano e 1,3 mil em 2014. Cinco empresas foram punidas por irregularidades. As punições variam de advertência, multa simples, multa pré-interditória, interdição e cassação de registro. O Exército conta com 120 militares para fazer esse serviço no Estado.
O Exército também realizou, em setembro, a Operação Rastilho, que resultou 18 autuações num só dia, em ação desencadeada em todo o país.
Carga rastreada
Alguns casos em que a Polícia Civil conseguiu localizar a origem da dinamite
Barra do Ribeiro, 14/10/2014
Naquela madrugada, ladrões destroem uma agência do Banrisul naquela cidade. Na fuga, os bandidos tiroteiam com a BM. Algumas bananas de dinamite são abandonadas. Pelo número do cordel, a Polícia Civil descobre que o explosivo fora vendido para a Roth Terraplenagem, empresa que pretendia usar o material numa obra em Vacaria. A empresa estocou a dinamite numa pedreira e parte dele sumiu. Dois funcionários teriam sumido com o material e são indiciados pela Delegacia de Roubos por furto.
Garibaldi, 27/10/2014
Cinco homens armados explodem o cofre do Posto do Avião, em Garibaldi, na RSC-470, por volta das 3h20min. A quadrilha rende um vigia, invade a loja de conveniência, usa dinamite e foge com o dinheiro. Na fuga, abandona um carro com fuzis, espingarda e algumas bananas de dinamite. Pelo rastreamento do cordel, a Delegacia de Roubos descobre que o explosivo seria usado numa obra em Quatro Barras (PR) e fora comprado pela empresa Planalto Explosivos (Planex). Os policiais fazem buscas na sede da empresa, em Capão Alto (SC). Os donos admitem ter vendido sobras de explosivo para terceiros. Os policiais rastreiam agora onde foi parar o material.
São Leopoldo, 1/11/2014
Um grupo de assaltantes é preso com armas, explosivos e carro roubado. Pelo exame, a Polícia Civil descobre que a dinamite é do mesmo lote usado num ataque ao Banrisul em Lindolfo Collor em 3 de agosto — talvez o mesmo grupo de ladrões que fez um assalto com explosivos e reféns, em 14 de junho, também naquele município. O explosivo pertencia à empresa Planalto (de Capão Alto, SC) e seria usado em Bento Gonçalves. É investigado como o material foi parar com criminosos.
Canoas, 1/01/2015
A Delegacia de Roubos apreende armas e explosivos e prende duas mulheres em uma casa de Canoas, que serve de base para uma quadrilha de assaltantes de bancos. O grupo seria responsável pelo ataque a uma agência bancária de General Câmara naquela madrugada e também por seis ataques em 2014. Tudo isso é concluído a partir do exame da dinamite, que foi comprada pela empresa Planalto (de Capão Alto, SC) e revendida a granel.
Nova Hartz, 07/05/2015
Num sítio do interior de Nova Hartz, agentes da Delegacia de Roubos prendem três integrantes de um grupo ligado à facção Os Manos. Com eles são encontrados quatro fuzis, coletes à prova de bala, espingardas e três dinamites. O rastreamento da dinamite mostrou que ela fora comprada pela empresa Planalto (de Capão Alto, SC) e revendida a granel.
Gravataí, 08/05/2015
O suspeito de atacar um banco com explosivos em Ana Rech (distrito de Caxias do Sul) em maio é preso em Gravataí por agentes da Delegacia de Roubos. Na casa dele são encontrados fuzis, roupas de assalto e bananas de dinamite, do mesmo tipo usado no ataque. O exame do explosivo mostra que foi comprado pela Planalto (de Capão Alto, SC) e revendido a granel.
Caxias do Sul, 10/06/2015
Agentes da Delegacia de Roubo trocam tiros com uma quadrilha escondida numa oficina do bairro São Cristóvão, em Caxias do Sul. Dois bandidos morrem e um fica ferido com gravidade. Um arsenal é apreendido, incluindo um raro fuzil calibre .30, de alto poder de fogo. O interrogatório de integrantes revela que o bando pretendia atacar um carro-forte em Nova Petrópolis e teria explodido cofre bancário em Ana Rech (distrito de Caxias). O explosivo encontrado pertencia à Planalto (de Capão Alto, SC) e teria sido revendido a granel.
Fonte: ZERO HORA – RIO GRANDE DO SUL – 16/11/15